Eu não falo palavrão. Também não sou de xingar. De vez em quando até sai uma ou outra palavra mais forte, mas é raro.
Sou católica, vou a igreja. Mas não é por isso que não falo palavrão. É por causa da minha mãe. Ela nunca me proibiu de falá-los. Nem mandou lavar minha boca com sabão. Ao invés disso, me contava uma história. Imagine que você está em um grande jardim e vai escolher flores para dar a alguém. Quais serão suas escolhas? As mais viçosas, bonitas, coloridas e perfumadas? Ou as murchas, amareladas, sem viço? Quais flores você entregaria a alguém?
Que palavras vou escolher?
Minha mãe me ensinou que quando a gente usa a linguagem, deve pensar a mesma coisa. Quais palavras vou escolher? As bonitas, que descrevem as coisas e explicam o mundo? Ou as feias, que ofendem, agridem, machucam, complicam?
Foi assim que ela nos ensinou a não falar palavrão. Ainda adulta, quase não falo. Devo confessar que às vezes sai. Mas eu lembro dela e da história das flores… Melhor não.
Linguagem neutra e inclusiva
Hoje, estava refletindo sobre linguagem neutra e inclusiva. Sobre o quanto tenho me esforçado para escrever textos livres de estereótipos e preconceitos, que possam ser lidos por tecnologias assistivas para que mais pessoas possam ter acesso às informações que sou contratada para produzir. Aí, me veio a metáfora criada pela minha mãe.
Estou em um jardim onde há flores comuns, das quais a maior parte das pessoas sabe o nome, a cor e o perfume. São fáceis de cuidar. Lá, também são cultivadas as mais raras flores, que precisam de temperatura especial, só florescem a cada 3 anos, demandam adubos caríssimos e mudanças frequentes no modo de regar e lidar com as pragas. Quais flores eu vou escolher para entregar às pessoas que lêem o que escrevo?
Eu adoro meu jardim. Cultivo flores simples, mesmo sabendo e tendo tempo de me dedicar às flores mais raras. Assim procuro fazer com as palavras. Ao escrever, vou cultivando um jardim de sentidos, de narrativas e histórias que vão apresentar ideias, vender produtos e projetos. Dizem que as mãos de quem oferece rosas ficam perfumadas. As mãos de quem escreve, cada vez mais, devem carregar diversas cores, diversas gentes, diversas vozes. Fica nelas a beleza de usar a linguagem para incluir, respeitar, escrever um mundo melhor.