Identidade funcional
Pouca gente sabe, mas comecei minha carreira como repórter, na Folha de S.Paulo. Recém formada em Jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina, voltei para Franca sem grandes perspectivas de carreira. Liguei para a sucursal da Folha que recentemente havia se instalado em Ribeirão Preto, me apresentei e perguntei se teriam algum trabalho para mim. No dia seguinte o editor me ligou e pediu aquela que seria minha primeira matéria profissional, sobre a greve dos sapateiros de Franca.
Entre 1991 e 1993, trabalhei como repórter da Folha. Algumas vezes como free lancer, outras contratada. Foi assim que vim parar em Uberlândia, sem conhecer uma viva alma por aqui. Ao chegar, encontrei um dos jornalistas cujo texto me encanta até hoje, Luiz Fernando Quirino. Mudei-me para implantar uma sucursal do jornal no Triângulo Mineiro. O projeto não deu certo e meses depois do fechamento, fui demitida do jornal.
Adriana repórter
Hoje, ao assistir à palestra do Caco Barcelos na Semana Internacional de Comunicação que acontece em Uberlândia, percebi que a Adriana repórter ainda mora em mim. Escrevo sobre o que não se fala, gosto de olhar pelo ângulo não visto. Afastei-me do Jornalismo, mas o Jornalismo não se afastou de mim. Estou sempre enxergando boas histórias, construindo-as em narrativas mentais.
Caco Barcelos lembrou-me de um Jornalismo que aprendi na faculdade, onde temos que ouvir todos os lados de uma questão e deixar que o leitor tire suas conclusões. Embora as palavras sejam carregadas de sentido e ideologia, como diria mestre Bakhtin.
Foi o que aprendi na Folha de S.Paulo, mas está longe do que vejo no Jornalismo local. Vejo cotidianamente matérias baseadas em uma fonte só. Vejo jornais pautados pelo poder público e pelas grandes empresas. Vejo muita assessoria de imprensa e pouca apuração. Vejo um jornalismo feito pelo telefone, feito para agradar editores e anunciantes, pouco se preocupando com leitores.
Caco Barcelos me deu vontade de voltar para a rua. Voltar a descobrir boas histórias. Voltar a buscar diferentes ângulos. Mas tornei-me uma escritora de narrativas corporativas, uma planejadora comunicacional, uma cidadã meio conformada com tanta coisa que deveria causar espanto.
Saudade de mim
O grande repórter me fez ter saudade de mim, da estudante dedicada que fui, da jornalista curiosa, com texto bem estruturado, cheia de perguntas. Nessa semana estou acompanhando tudo o que posso nessa I Semana Internacional de Comunicação. Meus 22 anos de carreira levaram-se de volta à sala de aula, como professora de jovens ávidos por conhecimento. Mas nesses dias em que volto ao papel de aprendiz, percebo o quanto são sábias as palavras de Guimarães Rosa: “Mestre não é quem sempre ensina, mas quem, de repente, aprende”.
Texto publicado originalmente no Facebook, em 6 de novembro de 2013.