Acima das nuvens, assaltou-me um pensamento. Deus deve estar a brincar com suas aquarelas, escolhendo cores para iluminar o fim da tarde. Talvez ele brinque de criar formas com as nuvens, que gigantescas se transformam em submarinos, montanhas, animais e formas indefinidas.
Quando criança, ao viajar na estrada, fosse de carro ou de trem, gostava de imaginar bichos e flores e coisas desenhadas nas nuvens. Era brinquedo tentar adivinhar o que víamos no céu. E cada um conseguia ver algo diferente. Todos estavam certos. Todos errados. Era nuvem. Era forma mutante. Era no instante do olhar. Depois, já não era mais.
Penso que seja assim também com nossas certezas. Durante tanto tempo nos apegamos a algumas delas. Olhamos sempre sob um mesmo ângulo e toda a interpretação do mundo e suas imperfeições cabe em nossas certezas e crenças.
Um dia, por curiosidade, vontade ou empurrados pelas circunstâncias, nosso olhar muda. Nossas crenças se tornam obsoletas e percebemos que é preciso transformar nossa nuvem de ideias em algo mais aberto a diferentes significados.
Talvez Deus esteja pintando e fazendo esculturas com nossas vidas e nossas escolhas, nesse exato momento. Talvez nos permita tanta transformação para que possamos entender que as nuvens tem sua forma que não significam realmente nada, apenas sua vontade de embelezar o céu e nos abrir sorrisos.
Me coloco novamente menina, viajando na estrada e tentando adivinhar as nuvens no céu. Não faz diferença quem vai acertar a forma de maneira exata. Afinal, em breve ela já será outra.
Em breve, também eu serei outra. Na descoberta de cada manhã.
Dedico esse texto, com todo o meu amor, à Cristina G Nogueira Redis, com quem tanto conversei nesses últimos dias. Que contribui para que eu possa aceitar o que vai, receber o que vem e criar para mim mesma a vida que quero (e mereço!) ter.
Publicado originalmente no Facebook, em março de 2019